Mais um seminário de Marcus Quintaes que é um importante expoente na psicologia arquetípica no Brasil.
“Este seminário sobre a clínica junguiana das psicoses, irá percorrer uma trajetória que terá como ponto de partida a herança dissociacionista oriunda da relação de Jung com Pierre Janet e T.Flournoy, da condição clínica das “psicoses” como modelos paradigmáticos da psique junguiana, atravesseremos os delírios Schreberianos, até a luta política da comunidade j’’unguiana na década de 80 pela não patologização do conceito de “Introversão” junto aos organizadores do DSM-III e finalizaremos com uma proposta de revisão imaginativa da política classificatória do DSM-V.” Marcus Quintaes
O Grupo de Estudos “ Fundamentos da Teoria Junguiana” desde o inicio março vem funcionando quinzenalmente aos sábados em Vitória. Este Grupo é uma iniciativa do “ Espaço Kairós” que é um grupo junguiano formado pelas psicólogas Indianara Pereira Melo(CRP 16/4364) , Carla Carion(CRP 16/1849, Patricia Lopes Cordeiro(CRP 16/1256) e Maria da Penha Guimarães Mello(CRP 16/814) que são queridas companheiras de caminhada no estudo junguiano aqui em Vitória, ES.
O Grupo de Estudos “ Fundamentos da Teoria Junguiana” tem como proposta discutir a psicologia analítica dialogando com outros saberes, assim, é um Grupo aberto a todos os interessados em conhecer um pouco mais da psicologia analítica.
O Grupo funciona quinzenalmente aos sábados, de 09h as 11h, com uma mensalidade de 80 reais.
Há algum tempo atrás, um vídeo chamou atenção da comunidade junguiana (pelo menos dos nerds junguianos) onde podíamos ver o confronto do Mestre Yoda com sua Sombra, Lado Negro. Esse vídeo que, na verdade, é um fragmento do episódio 12 da sexta temporada, intitulado Destiny, da série animada Star Wars – The Clone Wars, foi exibido na TV americana em 07 de março de 2014. Como nosso objetivo é fazer um comentário de tal fragmento (e. assim, invariavelmente faremos spoilers) eu convido ao leitor assistir ao vídeo legendado segundo o link abaixo, são pouco mais de 3 minutos .
Façamos um pequeno resumo . No vídeo vemos o Meste Yoda foi conduzido pelas cincos sacerdotisas da Força a uma caverna, onde ele seria testado.
Chegando na caverna ele percebe uma presença e escuta uma voz que o chama pelo nome, ao exigir que o desconhecido se apresente, Yoda é atacado, por pelo Lado Negro ou sua sombra, que diz:
– Yoda me odeia, sim… Yoda não brinca comigo mais! Yoda pensa que não sou digno! (Ao desvencilhar-se do ataque, eles travam um dialogo)
Yoda: – Yoda não reconhece você!
Lado Negro : Não vê o que está dentro de você, não é?
Y: Eu Escolhi não dar a você poder!
L.N.: Então você passa seus dias na decadência da guerra e com isso eu cresço dentro de você! Conheça seu verdadeiro “eu”! Me encare agora, ou Eu te devorarei!
A luta continua, Yoda ataca com veemência sua Sombra, ao achar que a dominou, pisando em seu pescoço, afirma
Y: Parte de Mim, você não é!
Mudando de posição e assumindo o ataque ao que Lado Negro responde:
L.N: Parte de você eu sou! Parte de tudo que vive! (Continuando o ataque feroz a Yoda) Porque você odeia o que te dá poder?! Yoda pensa que não sou digno!
Após muitos golpes. Yoda levanta e diz,
Y: Eu reconheço você agora! (o que assusta e faz com que o Lado Negro inicie outra investida, mas, Yoda usando da força, para o ataque e continua dizendo) Parte de mim você é, sim (e começa a atrair o Lado Negro para próximo de si) Mas poder sobre mim, você não tem! Sou eu quem controla você! Controle sobre mim você não possui! Meu lado Negro você é, e eu te rejeito.
Após tocar o rosto do Lado Negro, este desaparece. Uma sacerdotisa da Força aparece e afirma: Você conquistou sua Húbris, agora precisa encarar as tentações.
Esse fragmento do episódio é de fato bem arquetípico. O Mestre Yoda é conduzido a uma caverna. As cavernas são, por excelência, os símbolos da entrada e descida ao inconsciente, da “Katabasis” do herói, a descida a mundo inferior.
O encontro consigo mesmo significa, antes de mais nada, o encontro com a cuja dolorosa exigüidade não poupa quem quer que desça ao poço profundo.(Jung, 2000, p. 31)
Na consciência, somos nossos próprios senhores; aparentemente somos nossos próprios “fatores”. Mas se ultrapassarmos o pórtico da sombra, percebemos aterrorizados que somos objetos de fatores. (Jung, 2000, p33)
A entrada na caverna aponta para o distanciamento do mundo da consciência e da segurança da coletividade e das relações com o mundo exterior. Entrar na solidão da caverna nos possibilita ouvir e ver o que antes não era perceptível pois, somos despojados do controle e das ilusões de soberania do ego, na “caverna” o ego encontra-se em paridade com os demais conteúdos do inconsciente, o que gera uma profunda ansiedade ao ego. A Sombra do Mestre Yoda, afirma,
– Yoda me odeia, sim… Yoda não brinca comigo mais! Yoda pensa que não sou digno!
O contato com a sombra, isto é, o confronto com a sombra gera muita tensão para o ego. Especialmente porque a sombra se coloca como um adversário, o que não só reprimido mas, rejeitado por não ser adequado a dinâmica da consciência e dos valores da coletividade. Quanto mais identificado com os valores da consciência coletiva for um indivíduo, maior será o distanciamento que o mesmo terá da sombra. Devemos lembrar mestre Yoda foi durante muito tempo um ícone para a ordem Jedi (o mesmo viveu cerca de 900 anos), inspirando em todos a sabedoria e os valores cultivados pela ordem Jedi. Com as Guerras Clônicas, esses valores foram de fato superestimentos em face ao crescimento do poder do lado Negro da Força. É fato, também, que treinamento Jedi visava evitar ou reprimir tudo que pudesse ser relacionado com o lado negro . Por isso mesmo Yoda afirma,
– Yoda não reconhece você!
Não reconhecer a sombra é justamente o que a potencializa, especialmente, por que nos distanciarmos de nós mesmos, de nossas limitações, temores e desejos, de nossa humanidade. Com esse distanciamento, podemos incorrer numa inflação do Ego. Assim, ocorre exatamente como a Sombra de Yoda afirma, “você não vê o que está dentro de você”. Esta afirmação é importante, pois, indica uma a unilateralidade da consciência que faz com que o indivíduo acredite “ser apenas aquilo que gostaria de saber a respeito de si mesmo” (JUNG, 2000a, p. 145). De fato, muitas vezes, nos identificamos com as fantasias que criamos em torno de nós mesmos, que são meios para nos nos defendermos do que não querermos perceber em nós mesmos. Yoda chega a afirmar “Eu Escolhi não dar a você poder!” Fingir que não a sombra não existe ou não “investir” na sombra não a limita nem a incapacita. A Sombra, o Lado Negro responde
Então você passa seus dias na decadência da guerra e com isso eu cresço dentro de você! Conheça seu verdadeiro “eu”! Me encare agora, ou Eu te devorarei!
Tudo o que vivemos nos afeta de uma forma ou de outra. Quer queiramos ou não. Yoda podia controlar suas reações à guerra, controlar seus sentimentos, mas, não podia evitar que eles existissem. Quanto maior a identificação com a luz da consciência, maior será a escuridão interior, maior será a Sombra. Augusto dos Anjos, em seu poema Versos Intimos diz,
(…)
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
(…)
(ANJOS, 2001, p.85)
Yoda vivia um contexto de guerra, por mais que não aceitasse o lado negro da Força, sua liderança gerava efeitos destrutivos. Os Jedis tinham como principio usar a força como conhecimento e defesa justamente para evitar o lado negro da Força, raiva, ódio, vingança. Contudo, indiretamente ele produzia esse lado negro. O Lado Negro ainda apresenta uma ameaça interessante, afirma que se não for encarado é uma realidade, ou encaramos a sombra ou seremos devorados por ela, em neuroses e suas somatizações. No vídeo, Yoda tentou nega-la mais uma vez, dizendo que “parte de mim você, não é”. Essa negação reforça a sombra que inverte sua posição e retoma o ataque.
Parte de você eu sou! Parte de tudo que vive! (Continuando o ataque feroz a Yoda) Porque você odeia o que te dá poder?! Yoda pensa que não sou digno!
Acredito que essa parte seja muito importante. Penso que a Sombra, o Lado Negro, não se refere a si mesmo quando questiona “porque você odeia o que te dá poder!?” Acredito que esse questionamento se refere a própria Força. A força é composta tanto pelo lado luminoso quanto o lado sombrio, negar o lado sombrio também é negar a Força. Trazendo para nossa realidade, a Vida é luminosa e sombria, negar os aspectos sombrios é negar a própria vida. A sombra, não é em si mesma negativa.
Se as tendências reprimidas da sombra fossem totalmente más, não haveria qualquer problema. Mas, de um modo geral, a sombra é simplesmente vulgar, primitiva, inadequada e incômoda, e não de uma malignidade absoluta. Ela contém qualidades infantis e primitivas que, de algum modo, poderiam vivificar e embelezar a existência humana; mas o homem se choca contra as regras tradicionais. (JUNG, 1999, p. 83)
Aceitar a sombra é o primeiro passo em direção a totalidade, a integração e a um viver pleno. A cena que se segue é importante, Yoda afirma,
Eu reconheço você agora! (o que assusta e faz com que o Lado Negro inicie outra investida, mas, Yoda usando da força, para o ataque e continua dizendo) Parte de mim você é, sim (e começa a atrair o Lado Negro para próximo de si) Mas poder sobre mim, você não tem! Sou eu quem controla você! Controle sobre mim você não possui! Meu lado Negro você é, e eu te rejeito.
Aceitar a sombra, reconhecer sua presença e a traze-la parto da consciência é um desafio enorme. Jung afirma que
Todos nós trazemos conosco essa sombra, isto é, o aspecto inferior e, portanto, oculto da personalidade, a fraqueza que pertence a toda força, a noite que sucede a ao dia, o mal do bem. Reconhecê-lo vem naturalmente junto com o perigo de sucumbir à sombra. No entanto, com esse perigo nos é dada a possibilidade da decisão consciente de não sucumbir a ela.(JUNG, 1999b, p. 86)
Aceitar, integrar a sombra não significa se entregar a mesma. A rejeição de Yoda, neste caso, não é uma negação, não é fechar aos olhos. Pelo contrario, rejeitar a sombra é aceitar a dualidade interna. Sucumbir a sombra, ou aceita-la incondicionalmente é ser tomado por ela – como foi com Anakin Skywalker – por isso, a escolha de e o toque na sombra, o toque como um gesto simbólico e transcendente que integra a sombra, trazendo a responsabilidade de saber quem se é, assim como, de ser responsável pelas próprias escolhas. Rejeitar a Sombra nesse caso é assenta-la no lugar que apropriado. Para pensarmos essa rejeição podemos pensar nas tentações de Cristo, que interpretamos como a integração da Sombra, após a terceira tentação Cristo o texto diz “Jesus lhe disse: “Retire-se, Satanás! Pois está escrito: ‘Adore o Senhor, o seu Deus e só a ele preste culto’”. (Mateus 4:10 -NVI)
Após tocar a sombra e integra-la, a sacerdotisa da Força aparece e afirma “ Você conquistou sua Húbris”. A Húbris é o termo grego que pode ser traduzido como desmedida, excesso, orgulho, arrogância, vaidade, tudo que passa dos limites. A Hubris de Yoda certamente estaria vinculada ao lado luminoso da Força, a um ideal jedi. Reconhecer a imperfeição, reconhecer a sombra, é um ato de humildade de nos coloca em nossa própria realidade, em nosso próprio tamanho, de forma saudável. Para Yoda, reconhecer o lado Negro em si, aceita-lo, implica em um ato continuo de humildade. No dia a dia, vemos muitas situações em que as pessoas querem ser “boas”, corretas, agradáveis muitas vezes, numa compensação da própria sombra, buscam pelo extremo oposto negar o que há em sua sombra, isso só gera uma projeção ainda maior da sombra e uma incompatibilidade com a vida. Quase todas as tradições religiosas advertem contra esse excesso e a moderação, mesmo não sendo tão comentado no cristianismo de hoje, a bíblia diz
Não seja excessivamente justo nem demasiadamente sábio; por que destruir-se a si mesmo? Não seja demasiadamente ímpio e não seja tolo; por que morrer antes do tempo? É bom reter uma coisa e não abrir mão da outra, pois quem teme a Deus evitará ambos os extremos. (Eclesiastes 7:16-18 – NVI)
Assim, perceber a nossa sombra, as nossas limitações, a nossa humanidade nos permite ter uma relação mais saudável com as pessoas, assim como com nós mesmos.
Referências
ANJOS, A. Eu e Outras Poesias, L&PM Pocket: Porto Alegre. 2001
ECLESIATES in BÍBLIA. Português. BÍBLIA SAGRADA: Nova Versão Internacional. Tradução da Comissão de Tradução da Sociedade Bíblica Internacional. São Paulo: Editora Vida, 2000.
MATEUS in BÍBLIA. Português. BÍBLIA SAGRADA: Nova Versão Internacional. Tradução da Comissão de Tradução da Sociedade Bíblica Internacional. São Paulo: Editora Vida, 2000.
JUNG, C.G. Natureza da Psique, Vozes:Petrópolis, 2000a.
___________ Os arquétipos e o Inconsciente Coletivo, Petropolis: Vozes, 2000b.
___________ Psicologia e Religião, Petropolis: Vozes, 1999.
Abaixo segue a divulgação e do curso de extensão na Paulus – RJ.
Café e Debate é um projeto cultural que proporciona cursos de aperfeiçoamento pessoal e profissional promovido pela Paulus.
Curso de Extensão: Livros de C.G. Jung, Estudos Clínicos e Livros Atuais.
Apresentação do Curso:
A psicologia junguiana é pouquíssimo divulgada nas universidades. Atualmente com o movimento da internet está havendo possibilidades de trocas e divulgação por meios não acadêmicos de sua obra. Temos na Paulus vários livros importantes sobre o tema da Psicologia Junguiana e paralelos entre estes e a obra de Jung. Muitos livros ainda não foram traduzidos e é fundamental a leitura dos mesmos, pelo menos a introdução dos temas abordados. Tudo vai facilitar o trabalho com as práticas, bem como divulgar os outros estudiosos da psicologia junguiana em geral.
Curso de Jung e sua Obra Divulgamos o próximo curso que oferecemos em parceria com a livraria Paulus, na Rua México , 111. O curso completo (9 palestras) será R$220,00. Aulas avulsas – Quarta R$25,00 / Sábado R$30,00. Horário: Quarta-Feira de 15h às 17h30 / Sábado 9h30 às 11h30 Inscrições na Livraria! Podem divulgar!
Cronograma curso: Parte 1 – Introduzindo a Obra de C. G. Jung 08 ABRIL – Quarta – 15h às 17h30 I – A Academia e a Obra de C. G. Jung e a Formação de Analistas – Cynthia Lira e Maddi Damião Junior – Parte 2 – fundamentos, temas dos livros de Jung e a clínica 18 ABRIL – Sábado – 9h30 às 11h30 I – Jung e Alquimia – Mysterium Coniunctionis e a questão das polaridades – Edinger e Jung – Elizabeth C. Cotta Mello 29 de ABRIL – Quarta – 15h às 17h30 II – Jung e a Imaginação ativa – Livro – Maddi Damião Junior 4 DE JULHO – Sábado – 9h30 às 11h30 III – Sonhos – Priscila Martins e Flávia Medina Parte 3 – Vivências e discussões teóricas e práticas 8 DE AGOSTO – Sábado – 9h30 às 11h30 I – Arteterapia Junguiana: Leitura de imagens pela arte e Pela Psicologia – Elizabeth Christina Cotta Mello 2 DE SETEMBRO – Quarta – 15h às 17h30 II – Vivência de Arteterapia – Arte e Psicologia Junguiana – Denise Nagem 3 DE OUTUBRO – Sábado – 9h30 às 11h30 III – Recursos expressivos e vivência de Psicologia Junguiana – Clínica e recursos expressivos – Nilce Pinto de Oliveira 18 DE NOVEMBRO – Quarta – 15h às 17h30 IV – Mandala e Cores – Damáris Novo 2 DE DEZEMBRO – Quarta – 15h às 17h30 V – Prática de Psicoterapia – Maddi Damião Junior
Fabrício Moraes
Psicólogo Clínico de Orientação Junguiana, Especialista em Teoria e Prática Junguiana, Coordenador de Grupos de Estudos, coordenador do blog "Jung no Espirito Santo" e Diretor do CEPAES.
Atendendimentos on-line e presencial.
Contato: fabriciomoraes@cepaes.com.br / 55 27 993166985
Kelly Tristão
Dra. Kelly Tristão
Psicóloga Clínica de Orientação Junguiana, Especialista em Teoria e Prática Junguiana. Docente em Ensino Superior, idealizadora do projeto "Feminilidade Junguiana", coordenadora de grupos de estudo e diretora do CEPAES
Realiza atendimentos psicoterapeuticos presencial e on-line e supervisão clinica.
Contato: kellytristao@cepaes.com.br / 55 27 992573335